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domingo, 30 de outubro de 2011

E o céu furasse

São cinco reais, respondo ao cliente e vejo que há alguém parado entre o caixa e a saída. Finjo naturalidade e desejo um bom dia ao cliente que acaba de receber o troco. Me viro e vejo um rosto estranho, uma senhora ofegante, com os olhos bem abertos, me olha fixamente. Sinto como se tivesse chegado ao meu estomago um cubo de gelo inteiro, e uma fisgada na axila. Tento não demonstrar o susto que levei, não sei se por medo de que fosse ela uma louca, ou pra tentar ser simpática.
- A senhora quer alguma coisa? - perguntei.
- Nada. - ela responde arquejante, a respiração cheirando mal.
- A senhora tá se sentindo bem, quer um copo d'água? - tinha a sensação de que ela me odiava por algum motivo.
- Nada! - disse apertando os dentes.
Senti um desconforto sem igual, ela virou-se atravessou a rua e sentou na calçada da frente. Com a respiração rápida, tentei tirar a imagem da cabeça, olhei para a televisão, voltei a olhar pra rua, e ela não estava mais lá.
Contei a história a noite pra minha mãe, que deu risada, não tendo nenhuma graça. Deitei na cama depois de dois pedaços de pizza e fiquei por horas pensando no olhar daquela mulher. Lembrei da Dona Miriam, aquela do conto do trem, que não queria deixar a vida ir embora, tentando com pernas curtas e uma fraqueza delicada se fazer eterna, chamando minha atenção para que sua história ficasse pra mim e pra quem quisesse ler. Lembrei da tristeza em forma de pedinte cego, também no trem, que perdi a chance de subornar com alguma moeda. E talvez a mulher arquejante e de olhos enormes tenha aparecido aqui na rua Piauí, só para se eternizar num escrito qualquer.





Pra quem não acompanha, enfim, se quiserem, sei lá. Dona Miriam http://relicariodasindias.blogspot.com/2011/07/em-duas-cidades.html

E a Tristeza: http://relicariodasindias.blogspot.com/2011/06/o-amor-mais-nausea.html

5 comentários:

  1. Deveria promover um encontro entre Dona Miriam,Tristeza,Cícero e a mulher arquejante dos olhos esbugalhados... As singelas tentativas de estabelecer contato com estas personagens, feitas pela atendente do caixa e a viajante metroviária diletante, não deram muito certo... talvez, sob os auspícios de sua pena, elas devessem ter mais uma oportunidade, mas desta vez esperando uma atitude mais corajosa destas ultimas, para assim nos revelar um pouco mais destas figuras tão cotidianas.

    Não tinha lido o conto da Dona Miriam, gostei!

    "linha Safira, que de jóia nada tem" (essa vou usar)


    Wesley

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  2. Quem sabe um dia esse encontro aconteça, mas sabe, o Cícero é do tipo ocupado, sem tempo pra encontros desse tipo. Muito obrigada por acompanhar Wesley :]

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  3. Que louco, vc vai linkando um conto no outro, isso pode ser uma estratégia com quem lê seus contos! provavelmente está senhora que não queria nada, do nada teu algo.
    Rodrigo

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  4. tua opinião sobre os alunos da usp é mediocre e hipocrita
    pensava mais de você

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